Apesar dos efeitos indesejados das mudanças no clima serem cada vez mais frequentes, como o recente incêndio florestal em Maui, no Havaí (EUA), que se tornou letal durante um período de seca e ventos fortes, comunicar sobre a urgência climática ainda é uma tarefa desafiadora.
Isso porque, não basta falar sobre o problema; para ser eficaz, a comunicação precisa prestar um serviço apontando soluções. “Como eu posso contribuir?” – seria o resultado esperado da comunicação eficaz sobre a necessidade de frearmos o aquecimento global.
Além de conscientizar, a comunicação eficaz para ação climática precisa engajar para mudanças de comportamento, postura e atitude, provocando uma mobilização coletiva para lidar com a urgência da crise.
No Brasil, assim como na maioria dos países do Sul Global, essa missão se torna mais crítica por dois motivos: primeiro porque suas populações estão mais sujeitas a sofrer com as consequências de eventos climáticos extremos e, segundo, porque seus territórios detém a maior parte das florestas nativas do mundo.
Estas florestas nativas, conhecidas por serem grandes retentoras ou emissoras de gases de efeito estufa, dependendo do quanto são conservadas ou destruídas, exercem papel determinante para a segurança climática. São a melhor tecnologia de que dispomos hoje, para regular o clima. Isso mesmo, uma solução eficaz, com base na natureza.
Comunicar sobre a conservação da natureza, das florestas e da biodiversidade, como uma solução para a segurança climática, é assim, uma responsabilidade pública e não somente da ciência. Esse debate precisa ocorrer em diversos âmbitos: da saúde e educação, da política e cidadania, de equidade e direitos humanos, e assim por diante.
Somente refletida em diferentes áreas, a comunicação para ação climática pode se tornar um catalizador social para implementarmos, de fato, as soluções existentes. Mas quantos de nós, brasileiros, defendemos a conservação do meio ambiente como um direito e um dever?
Apesar do Brasil ser um dos países com maior potencial de impactar o clima, pelo terceiro ano consecutivo, uma pesquisa do Instituto de Tecnologia & Sociedade do Rio (ITS), em parceria com a Universidade de Yale e o IPEC (Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica), revelou que apenas 22% consideram saber muito sobre aquecimento global e mudanças climáticas.
O relatório “Mudanças Climáticas na percepção dos brasileiros 2022”, lançado em junho desse ano em uma coletiva online, apresentou dados sobre o sentimento público a respeito do tema, principalmente, através do impacto percebido em nosso quotidiano, como o aumento do preço dos alimentos, da poluição, da conta de energia, da falta ou excesso de chuvas, e dos consequentes desastres ambientais. A maioria dos entrevistados também revelou estar, de fato, preocupada com as ameaças do clima.
Embora a pesquisa tenha trazido outros dados muito interessantes, esse único dado deixa clara a necessidade de mais brasileiros entenderem sobre um assunto que já vem afetando suas vidas, desde a saúde física e mental, até a financeira. Em contrapartida, esse sentimento público de estarmos cada vez mais vulneráveis aos riscos do clima é terreno fértil para uma comunicação de engajamento para a ação climática.
As soluções climáticas com base na natureza são ações para proteger, gerenciar de forma sustentável ou restaurar ecossistemas naturais, como as florestas nativas equatoriais, protegendo o meio ambiente e os serviços prestados por ele, como chuvas, retirada e armazenamento de gases de efeito estufa da atmosfera, regulando assim, a temperatura e o clima do planeta.
Porém, a ciência e as soluções climáticas ainda são mais conhecidas dos especialistas e da academia do que do cidadão comum, para o qual as relações de causa e efeito que permeiam esse tema, ainda podem parecer abstratas e intangíveis.
Dados e estimativas, como a meta de mantermos a média de temperatura global abaixo de 1,5º C em relação aos níveis pré-industriais até 2030, evitando colocar em risco o equilíbrio da vida no planeta, não soam tão urgentes. Quanto mais longo o horizonte de tempo, mais incertezas pairam sobre as nossas próprias projeções. E incertezas levam a adiamentos.
As ciências sociais e da comunicação explicam que nossas visões de mundo, valores e normas sociais ditam como recebemos informações e as aplicamos de maneira prática em nossas vidas. Portanto, é preciso saber comunicar fatos e dados de uma forma não científica, tampouco dogmática, por meio de exemplos e experiências compartilhadas que tornem a mensagem mais compreensível e conexa com a rotina do público.
Para ajudar com esse desafio, a Climate Outreach, agência especializada em comunicação sobre mudanças climáticas, vem divulgando ferramentas para tratar da comunicação climática através da conexão com valores, senso de identidade e visão de mundo locais.
Aliada ao IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas), força tarefa que publica relatórios anuais sobre as mudanças do clima, esta agência desenvolveu um guia prático para ajudar especialistas a comunicar sobre mudanças climáticas com qualquer audiência.
Este guia sugere seis princípios para comunicar de forma simples, engajando para ações climáticas. Veja quais são:
Mensagens de fontes confiáveis tendem a ser mais persuasivas. Especialistas geralmente atribuem credibilidade à mensagem. Seja confiante ao se comunicar, estabelecendo referências que demonstrem seu conhecimento e vivência sobre o assunto.
Jargões científicos como concentrações de dióxido de carbono atmosférico, não se relacionam com as experiências do dia a dia da maioria das pessoas. A poluição sim. Comece sua conversa sobre clima com fundamentos comuns, usando linguagem clara e exemplos com os quais seu público provavelmente estará mais familiarizado.
Valores e opiniões pessoais têm uma influência maior na postura diante do tema das mudanças climáticas do que o nível de conhecimento científico das pessoas. Conectando com valores locais amplamente compartilhados tornará mais provável que a sua mensagem seja compreendida.
A maioria das pessoas entende o mundo por meio de anedotas e histórias, mais do que estatísticas e gráficos. Invista em uma narrativa que mostre o que há de humano por trás dos números. Contar sobre experiências que levaram a uma conclusão pode ajudar a ilustrar o assunto tornando a história mais envolvente.
A incerteza é uma característica da ciência do clima que não deve ser ignorada ou deixada de lado, mas pode tornar-se um grande obstáculo nas conversas com não-cientistas. Concentre-se nos “conhecidos” antes do “desconhecido” e enfatize áreas onde a concordância científica é forte em torno de um tema.
Na comunicação verbal ou escrita, a escolha de imagens e gráficos é tão importante quanto evidências e dados. Nesse sentido, o projeto Climate Visuals, oferece uma série de recursos, incluindo vídeos e fotografias, para enriquecer sua narrativa sobre mudanças climáticas.
Por mais que as boas práticas para a comunicação climática eficaz venham evoluindo, ainda são poucos os que se consideram aptos a promover o engajamento efetivo com ações em prol da natureza e do clima. Mas para ter efeito coletivo, essa comunicação precisa, e pode, se dar através de diversas esferas de influência.
Um médico, por exemplo, que já desfruta da confiança dos seus pacientes, pode relacionar problemas de saúde com o excesso de calor e de poluição provocados pelas agressões do homem ao meio ambiente. Estabelecendo essa conexão, autêntica e legítima, os pacientes estarão abertos a compreender relações de causa e efeito, como desmatamento e má qualidade do ar. Isso fará com que se conscientizem que o direito ao ar menos poluído é tão importante quanto o direito à saúde.
Sabendo que as pessoas se abrem para estórias que as tocam e com as quais se identificam, por compartilharmos da vulnerabilidade humana, comunicar a respeito das mudanças climáticas e das soluções disponíveis para elas, torna-se ação eficaz para influenciar políticas e movimentos que resultem na conservação da natureza.
Quanto mais atores reverberarem a mensagem localmente, maior será o engajamento plural necessário para protegermos o meio ambiente, e os serviços prestados pela natureza, como a regulação do clima, tão necessária para a vida no planeta.
Com um desafio tão complexo quanto esse, as pessoas precisam saber que existem soluções para lidar com o problema e que fazem parte dessas soluções.
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Adriana Martins é diretora de comunicação da Permian Brasil, administradora de empresas pela FGV, com MBA em marketing pela Babson College e certificada pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial em “Comunicação Avançada para a Sustentabilidade”. Viciada em aprender e comunicar, apaixonada por trabalhar com propósito pela conservação da natureza e pela segurança climática.