Atuando em projetos de conservação da natureza em parceria com comunidades na Amazônia, temos aprendido que comunicar, mais do que habilidades técnicas e materiais de suporte, requer empatia, escuta ativa e sobretudo, um interesse genuíno pela construção de relacionamentos autênticos com as comunidades, baseando-se em confiança e respeito mútuo.
Neste artigo, compartilhamos aprendizados que consideramos essenciais para fortalecer laços com comunidades amazônicas e engajá-las com projetos de conservação de florestas que tragam benefícios para pessoas, biodiversidade e clima.
Ouvir é o primeiro gesto de respeito. Mas é necessário ir além da escuta convencional: trata-se de ouvir com presença e autenticidade, demonstrando intenção real de entender contextos, necessidades e realidades. No contexto dos projetos em parceria, essa escuta também deve considerar o tempo da comunidade, seus ritmos e rotinas, prioridades e formas de expressão. A verdadeira conexão nasce quando se ouve com o coração, não apenas com os ouvidos.
Nas reuniões com as famílias parceiras do projeto de conservação da natureza na RESEX do Rio Cautário, nosso plano de comunicação se iniciou através da imersão nas comunidades para ouvir suas histórias, desafios e conquistas. Esta prática comunicou que valorizávamos seu protagonismo permitindo que, a cada encontro, nossa confiança crescesse com base na premissa de que não se trata de nós, parceiros nesse processo, mas delas protagonizando a comunicação.
Compreender a cultura e os rituais de uma comunidade é fundamental para estabelecer canais eficazes de comunicação. Por isso, ajustamos nossas oficinas e assembleias aos ritmos da vida local na RESEX, respeitando períodos de colheita da castanha ou de pesca. Este alinhamento demonstra nosso respeito pelo seu modo de vida e fortalece as relações que se aprofundam a cada encontro em campo.
A comunicação não pode ser alheia aos costumes, tradições, acontecimentos e lutas locais. Incorporar a realidade diária às abordagens comunicativas com as comunidades é uma forma de reconhecer o contexto socioeconômico nas inter-relações.
Dada a diversidade dos níveis de literacia dentro das comunidades, é essencial trabalhar com uma multiplicidade de abordagens acessíveis, desde a comunicação oral, atividades interativas e lúdicas e figuras de linguagem, priorizando recursos visuais de apoio, teatro, analogias simples e experiências práticas.
Frequentemente, concebemos dinâmicas que incentivam a participação de jovens e mulheres da comunidade e a troca de saberes, promovendo capacitações, rodas de conversa e coletivos, com apoio logístico, para integração intra e inter comunidades dentro do território.
Os projetos de conservação podem facilmente sobrecarregar a comunicação com conceitos técnicos e jargões. Traduzir estes termos para uma linguagem quotidiana é importante, mas ainda mais crucial é reconhecer o conhecimento que já existe. Convidamos sempre os membros da comunidade a explicar com as próprias palavras como se sentem sobre um determinado conceito e o que compreenderam dele, em relação ao seu saber local. Assim, a autoconfiança é reforçada para o equilíbrio da relação, pois os exemplos locais não só complementam, mas nos ensinam novas formas de comunicar enquanto reforçam conceitos para todos. Esta reciprocidade torna a comunicação verdadeiramente bidirecional reforçando a liberade necessária para a expressão de opiniões sinceras e sugestões de melhoria.
A comunicação também se constrói através da alegria, da arte e do afeto. Nas assembleias comunitárias, rodas de discussão e oficinas, criamos momentos de entretenimento — com concursos tradicionais e jogos coletivos — para transmitir a mensagem de que somos todos parte da mesma equipe. Estas práticas mantêm um vínculo que vai além dos objetivos técnicos e incentivam o empoderamento comunitário. A interatividade e o entretenimento têm, portanto, papel central na compreensão de conceitos e na criação de ambientes de expressão e troca.
A comunicação para o engajamento e empodearmento comunitários não pode ser unidirecional. Constantemente, buscamos o exercício do protagonismo local através dos testemunhos sobre como o projeto está melhorando a vida das famílias e transformando a realidade do território. Frequentemente, reproduzimos essas falas em materiais audiovisuais para compartilhamento com todos e como endosso comunitário para as mídias do projeto, além de incorporá-los a materiais usados pelas lideranças em visitas a organismos e associações representativas. Estas vozes são poderosas para amplificar relatos e desenvolver relacionamentos com outras partes interessadas, atestando integridade do ponto de vista dos que ali vivem e protegem a floresta.
Reforçar conceitos-chave, adaptar a linguagem com base nas reações do público e alavancar a divulgação dos conceitos através de multiplicadores locais aumentam o alcance, a frequência e a eficácia da comunicação. A difusão de ideias centrais por múltiplas pessoas, multiplicadoras neste processo, em diversos canais, contribui para incorporar estes conceitos no quotidiano das comunidades.
Uma comunicação bem-sucedida é o alicerce sobre o qual se constroem projetos de conservação equitativos e transparentes. É a via através da qual o Consentimento Livre, Prévio e Informado (CLPI) se torna contínuo, permitindo que a autodeterminação e a validação da comunidade se concretizem verdadeiramente.
A nossa experiência mostra que ir além de uma abordagem transacional, priorizando o envolvimento através de uma comunicação genuína, culturalmente sensível e contínua, é fundamental. Desde o início, já observamos um enorme ganho em abertura, confiança e autoconfiança por parte das comunidades ao perceberem que não estávamos ali para as convencer sobre qual decisão tomar, mas para oferecer maior embasamento para as suas próprias decisões. Esta relação, em constante evolução e aperfeiçoamento, é o que torna o projeto de conservação mais relevante para elas, e assim, duradouro e justo.
Sabemos que o futuro dos projetos de conservação na Amazônia depende intrinsecamente da capacidade de construir e manter relações duradouras com e entre os atores locais que protegem a floresta.
Para um exemplo real da interação das comunidades com a nossa equipa no território, visite aqui.
—
Este artigo foi publicado originalmente no blog da Permian Global em 29 de setembro de 2025.